Fundamentos da Psicoterapia Positiva – Forças de Caráter
Resumo
As forças de caráter, núcleo da Psicologia Positiva, são reinterpretadas neste artigo como alicerces para a construção de uma identidade resiliente e autêntica no Prothocolo Psicotherapêutico. Articulando o modelo VIA (Values in Action) de Peterson e Seligman com os pilares do protocolo — verbos psicológicos, “tu”, hic et nunc e centralidade do Acolhido(a) —, propõe-se uma prática clínica que transcende a mera identificação de virtudes. Em vez disso, busca-se integrar forças pessoais à narrativa existencial do Acolhido(a), transformando potencialidades abstratas em gestos concretos de significado.
1. Introdução
A Psicologia Positiva, frequentemente associada à catalogação de virtudes, ganha profundidade clínica quando as forças de caráter são exploradas como processos dinâmicos de vir-a-ser. No Prothocolo Psicotherapêutico, tais forças não são inventariadas como rótulos, mas vividas como verbos: ações que o Acolhido(a) pode reconhecer, ressignificar e reativar no hic et nunc. Este artigo investiga como a linguagem — especialmente o uso intencional do “tu” e de metáforas relacionais — opera como ponte entre teoria e prática, permitindo que forças como coragem, criatividade e gratidão sejam (re)descobridas como recursos internos dialógicos.
2. Fundamentos Teóricos
2.1. O Modelo VIA e as 24 Forças de Caráter
Peterson e Seligman categorizaram 24 forças sob seis virtudes universais:
- Sabedoria e Conhecimento (ex: curiosidade, amor pelo aprendizado).
- Coragem (ex: perseverança, integridade).
- Humanidade (ex: bondade, inteligência social).
- Justiça (ex: trabalho em equipe, liderança).
- Temperança (ex: perdão, humildade).
- Transcendência (ex: gratidão, esperança).
No protocolo, essas categorias são fluidas, evitando hierarquias fixas: “Tu podes ser generoso(a) hoje e ainda assim necessitar cultivar paciência”.
2.2. Forças como Processos, Não como Traços
Ao contrário de abordagens essencialistas, o protocolo enfatiza forças em ação:
- “Como a tua curiosidade se manifestou nesta semana?” (verbos no passado recente).
- “O que a gratidão te convida a fazer agora?” (verbos no presente).
2.3. Fenomenologia das Forças
Inspirado em Heidegger, o protocolo entende as forças como modos de Ser-no-Mundo. Por exemplo, a coragem não é um atributo estático, mas uma resposta ativa ao medo: “Como tu te moves em direção ao que te assusta?”
3. Análise Conceitual-Prática
3.1. Verbos Psicológicos e Ativação de Forças
Verbos como ousar, criar e agradecer são ferramentas para materializar forças:
- Exemplo:
- Acolhido(a): “Sempre fui muito ansioso(a)”.
- Terapeuta: “Quando ansiedade surge, qual força tu escolhes para responder a ela neste momento?”
3.2. O “Tu” como Dono(a) das Próprias Forças
O pronome “tu” atribui autoria e responsabilidade:
- “Tu já usaste a criatividade para resolver problemas. Como podes reativá-la hoje?” (vs. “A criatividade ajuda em crises”).
3.3. Metáforas de Recurso Interno
Analogias conectam forças a experiências sensoriais:
- “Se tua perseverança fosse um músculo, como tu a exercitas hoje?”
4. Aplicações Clínicas
4.1. Mapeamento Vivo de Forças
- Técnica: Usar o hic et nunc para identificar forças em tempo real:
- “Enquanto falas sobre teu projeto, que força(s) tu percebes em ação? Como nomearias isso?”
4.2. Reengajamento de Forças Adormecidas
- Intervenção:
- Acolhido(a): “Antes eu era mais otimista”.
- Terapeuta: “O que o ‘tu’ do passado diria ao ‘tu’ de hoje sobre esperança?”
4.3. Caso Clínico: Burnout e Ressignificação
Acolhido(a) relata: “Perdi a motivação no trabalho”.
Intervenção:
- Identificação de Forças: “Que forças te sustentaram em desafios anteriores?”
- Conexão com o Presente: “Como a persistência, que já te guiou, pode se adaptar ao contexto atual?”
- Ação Concreta: “Que pequeno passo tu podes dar hoje para realinhar trabalho e propósito?”
5. Desafios e Reflexões Críticas
5.1. Cultura e Universalidade das Forças
Algumas forças são valorizadas diferentemente em contextos culturais (ex: “humildade” em culturas coletivistas vs. individualistas). Adaptar perguntas:
- “Como tua comunidade reconhece a liderança em ti?”
5.2. Evitar a Romantização
Forças não são panaceias. Validar limites:
- “Mesmo com toda tua coragem, é válido recuar quando necessário. Como tu sabes quando parar?”
5.3. Forças em Conflito
O uso excessivo de uma força pode minar outras (ex: perseverança vs. autocuidado). Explorar equilíbrios:
- “Como a tua determinação dialoga com teu direito ao descanso?”
6. Conclusão
As forças de caráter, no Prothocolo Psicotherapêutico, não são listas a serem marcadas, mas verbos a serem conjugados no presente. Através do “tu”, da linguagem metafórica e da ancoragem no hic et nunc, o Acolhido(a) é convidado(a) a reescrever sua narrativa como protagonista de recursos muitas vezes subjugados por histórias de déficit. Este enfoque não nega a dor, mas amplia o repertório existencial, lembrando que mesmo na adversidade, forças latentes aguardam reconhecimento e uso ético. Futuras pesquisas poderiam explorar como a ativação de forças se correlaciona com neuroplasticidade, sempre priorizando a voz do Acolhido(a) como guia.